Um Inverno debaixo da Mesa (2001)

Texto de Roland Topor
Encenação de Maria do Céu Guerra
Teatro Cinearte, 3 de Julho

FICHA ARTÍSTICA E TÉCNICA

Tradução: Maria Carlota Guerra

Espaço Cénico e Programa: Maria do Céu Guerra

Música: António Victorino d’Almeida

Execução Musical: Ana Victorino d’Almeida

Apoio Musical: Madalena Reis

Adereços: Victor Sá Machado

Desenho de Luz: Francisco Grave

Operação de Luz, Assistente de Cena: Bruno Gouveia

Sonoplastia: Fernando Pires

Cartaz: Roland Topor

Carpintaria de Cena: Mário Dias, Paulo Ramalho

Secretariado: Maria Navarro

Produção: Bárbara Rocha

Apoio à Produção: Sérgio Moras

Elenco: Catarina Santana, Miguel Telmo, Luis Thomar, Mafalda Franco, Carlos Sebastião

Real e o sonho


Não é a primeira vez que falamos de emigração, é natural, A BARRACA está cheia de exílios: Helder, Boal, etc., etc...
"Agosto" e "0 bode expiatório" constituíram duas abordagens por onde passou a saudade, os medos, o desespero, o sentimento de exílio, o chauvinismo. Abordagens necessariamente diferentes, porque a novelística portuguesa sobre o emigrante em que se apoiava "Agosto", nada tem a ver com o genial desespero de R. w. Fassbinder e a sua rude Alemanha. Mas ambos, afinal, eram filtrados por um olhar comum (o meu) e com um mesmo objectivo, aquele que (persigo quando prossigo) verso de João Pedro Grabato Dias e se resume numa frase: "Olhem para isto".
É com a vontade de que "olhem para isto" que faço de novo um espectáculo com emigrantes em cena. Estes são tipos especiais, são de Leste (não sei se sabem que se juntarmos ucranianos, bielorussos e romenos obteremos agora a segunda maior percentagem de emigrantes no nosso país), e são pessoas que estão profissionalmente acima das tarefas a que têm acesso, são bem educados e vão triunfar.
É digamos assim, uma história cor-de-rosa que de certo modo aconteceu na vida do autor e que pode acontecer no nosso tempo.
Na verdade, o pai de Roland Topor foi emigrante polaco em Paris durante a guerra (claro que não foi para debaixo de uma mesa, mas para um campo de concentração). E, no fim da vida, veio a ser reconhecido como o pintor que era e a ser pai do mais célebre e genial desenhador do nosso querido século passado.
Topor o feroz autor negro, não tem aqui coragem de o ser. Quer fazer uma homenagem ao seu amado pai, pintor, judeu, exilado com um pequeno negócio de artesanato de pele para manter a família, no ano de sua morte. Ele que diz, num dos seus aforismos, que só está bem o que acaba mal, ei-lo a criar uma comédia terna, quase sem azedume.
E eis-nos a nós a revisitar Topor o criador libérrimo de tantas imagens que nos povoaram três décadas de vida. Topor com seu ódio à prepotência, a sua pulsão escatológica, o seu culto pela irrisão, a sua poesia.
E a pensar nele e neste parêntesis optimista e solidário da sua obra penso em Alexandre O'Neil à procura "de uma comunhão com os outros homens sem perda de prestígio para a poesia" e a afastar-se do surrealismo e a afirmar "é tempo de unir no mesmo grito o real e o sonho".
Com este espectáculo mais uma vez A Barraca gostaria de vos dizer: Olhem para isto. Há pessoas debaixo das nossas mesas.


Maria do Céu Guerra

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