O Príncipe de Spandau (1998)

Texto e encenação de Hélder Costa
Teatro Cinearte, 8 de Maio


FICHA ARTÍSTICA E TÉCNICA

Cenografia, Cartaz: José Manuel Castanheira

Assistente de Encenação: João Azevedo

Luminotecnia: José Carlos Pontes

Sonoplastia: Fernando Pires

Fotografia: Mário Cabral

Elenco: João D’Ávila

O ovo da serpente


O que se pode escrever para falar do nazismo?
Parece que foi tudo dito.
Os pais falam do horror, do crime, dos campos de concentração, do racismo. Os filhos, hoje em liberdade, pressentem confusamente que lhes falam de uns E.T's e de uma desumanidade que não compreendem. Mas o nazismo não é só a bota militar, o uniforme, o braço estendido, o Heil Hitler, a arrogância, a discriminação, o racismo, o quero, posso e mando.
O nazismo - e as suas metáforas e máscaras suaves apropriadas ás circunstâncias - sabe ocultar-se dos ventos desfavoráveis do progresso. E também sabe usar o excesso e o folclore - podem ser skinheads, claques de futebol, reuniões de jet-set, homenagens aos "bons e lídimos" princípios do passado - para demonstrarem que existem, que têm força e que metem medo.
Nada disto é novidade.
O que para mim é absolutamente novo é a irresponsabilidade com que não se quer perceber - e, consequentemente, combater - o vírus que cria permanentemente os focos de insegurança onde o nazismo sempre foi colher os seus melhores frutos: a miséria, o desemprego, a exclusão social. Tudo isto é o aconchego do ovo da serpente.
Será que já nos esquecemos que as forças mais violentas de Hitler eram recrutadas no lumpen e também na classe operária? Que o campesinato era a grande rectaguarda do conservadorismo social e religioso? Que a mulher era recrutada ao som da Igreja, cozinha e filhos? Que os jovens viam na saga Hitleriana a paixão e o risco que entusiasmava o seu sangue generoso?
T. alvez seja esta a questão a resolver: se as crises existem, a esquerda tem de ter uma resposta para elas. Caso contrário, os que deviam estar com a esquerda passam para o extremismo de direita.
Citarei um excerto da peça sobre a ascenção de Hitler ao poder:
"Dizem que tudo esteve a nosso favor: a crise de 1930, as manobras dos magnates e da Bolsa, a corrupção dos governos.
Esteve tanto a nosso favor, como a favor dos nossos inimigos. As mudanças no mundo não acontecem por milagre. As sociedades mudam porque há conflitos de interesse, porque há luta de classes.
E nós é que ganhámos essa luta de classes."
Só quero que esta História - mesmo em farsa - não se repita.

Hélder Costa

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