Marly – A Vampira de Ourinhos (1994)

Texto de Carlos Queiroz Telles
Direcção de Maria do Céu Guerra
Teatro Cinearte, 15 de Novembro


FICHA ARTÍSTICA E TÉCNICA

Cenografia: Norberto Barraco

Figurinos: Mário João Garcia

Guarda-Roupa: Susana Afonso

Adereços: Victor Sá Machado

Apoio de Movimento: Paulo Ribeiro

Sonoplastia: Marinel Matos, Paulo Xavier

Contra-Regra e Escultura Marly-Mariazinha: Miguel Figueiredo

Fotografia: Carlos Gil

Cartaz: Nuno Antunes

Música: Canção alentejana cantada à capela por Vitorino

Elenco: Maria do Céu Guerra, Pedro Alpiarça

Entra em cena Marly


Carlos Queiroz Telles é um autor brasileiro dos nossos dias. Conheci o director da TV Cultura de S. Paulo, e professor de dramaturgia na USP, num daqueles lugares mágicos onde se acredita que o teatro é a maior das artes e os seus artistas as mais perturbadoras das criaturas.
Chamava-se Espaço Pirandello, era na Rua Augusta e julgo que já não existe. O Carlos era uma dessas pessoas que S. Paulo inventou para nos compensar do ar de que nos priva quando lá estamos, os maravilhosos paulistas que fazem daquela cidade tão árdua um dos lugares mais quentes e interessantes do mundo.
Há anos vi esta sua peça num festival de teatro, deliciei-me com ela e mandei-lha pedir.
Com a disponibilidade e alegria daqueles tropicais, ele respondeu-me esfuziante que fizesse a peça e que a adaptasse até onde e como quisesse.
Ele já cá não está para ver como brinquei com o seu brinquedo. Tenho a certeza de que riria muito a ver-me falar "brasilês" e a ouvir a sua Marly comportar-se à moda do Porto ou a falar à  alentejana.
Sei que fez esta obra para que todos nos divertíssemos bastante, mas também para lembrar que a sua e a nossa arte é a que está mais perto da ideia que se faz de Deus.
Como em muitas outras artes, criamos gente, traçamos destinos, inventamos histórias, mas só nós, deuses da brincadeira, lhes damos carne e voz e espaço físico para respirar. E quando a vida nos permite testemunhar o momento em que um autor e um actor discutem quem é aquele que, por eles, passará do nada ao ser, estamos no mínimo a beneficiar de um privilégio. Carlos Queiroz Telles, com a sua enorme experiência de escritor e de director, soube trazer esse momento a público em boa hora. Melhor, fê-lo a rir.
E entra em cena Marly, Marly cheia de medo. Personagem em estado puro, à procura de máscara que a revelará, ou máscara em estado bruto à procura da alma que por ela se vai exprimir?
Marly, a recém-nascida de uma discussão nobre, que se repete de cada vez.
Marly "educadora na teoria e puta na prática". Vampira, como todos nós.
Que a vida te seja leve, agora que vais ver a luz num país em que o Teatro é muito menos estimado do que naquele em que a outra Marly, tua irmã do outro lado do mar, ouviu rir pela primeira vez.


Maria do Céu Guerra

Anterior
Anterior

1994. Pastéis de Nata para a Avó

Próximo
Próximo

1995. Não há nada que se coma?